Apesar de já terem passado mais de 36 horas, continuo em extâse...
A partir do momento em que Leonard Cohen entra em palco e diz "Hi! Good Evening! Thank you for coming tonight...", é impossivel não ficar imediatamente estarrecido... Assistir àquele concerto tornou-se um acto de veneração de quase 3 horas.
As condições não eram nem de perto as adequadas. Estávamos ao ar livre, num parque de estacionamento, mais de 10.000 pessoas. Havia apenas duas barracas para comprar algo que se pudesse comer, 3 para bebidas e uma casa de banho individual... A quantidade de concertos que se sucede no Verão é vergonhosa: obriga o público a fazer escolhas (em Lisboa na mesma noite, Lou Reed; no Porto, a 3.ª noite do Marés Vivas com um cartaz quase tão bom quanto o Optimus Alive); os recintos não têm qualidade; os espectáculos são pouco rentáveis (o que levará á sua extinção...). Durante o resto do ano pouco há... a concentração de eventos em Lisboa é também, e só por si, esmagadora. Tudo indica que os espectáculos de música em Portugal são uma mina, que rapidamente se esgotará...
Vi passar por mim Durão Barroso, Colin Farell e Tim Robbins. A plateia tinha uma quantidade de estrangeiros impressionante... e sendo dominada por pessoas com mais de 40 anos, de destacar a quantidade de miúdos (menos de 20 anos), que marcaram presença e cantavam as letras com igual desenvoltura ao que sucederia num concerto dos Tokio Hotel ou dos Likin Park. Este é o tipo de concerto que deveria ser assistido numa excelente sala de espectáculos, dando ao cantor o seu melhor ambiente intimista. Nunca esperei ver e sentir o que me foi presenteado... ao fim daquelas modestas palavras, o Passeio Marítimo de Algés (onde decorreu o fantástico Optimus Alive), tinha-se transformado na mais intimista sala de espectáculos, com a figura de Leonard Cohen a impor tal presença, que nos faz sentir insignificantes tal a sua delicadeza, tranquilidade, educação, elegância, serenidade, grandiosidade, e acima de tudo, humildade!
O espectáculo é em tudo surpreendente. Leonard Cohen é um profissional, um mestre, um Senhor! Não, não me refiro só à arte da música e da poesia; refiro-me à arte de viver! E é isso que impressiona mais... a sua actuação transmite uma quantidade de sensações, sentimentos e emoções... passei o concerto com as lágrimas nos olhos e aquela comichão na ponta do nariz (e em grande esforço para que não fosse perceptível... a sensação permaneceu, quer ontem enquanto contava o que vi ao meu Pai, quer hoje enquanto escrevo...), arrepiado da ponta dos pés à ponta dos cabelos, e a transpirar... apesar da leve brisa que corria e de eu estar apenas de t-shirt.
A surpresa começa logo com a entrada em palco: entra sozinho, seguido depois da banda, à hora estipulada (21h00 em ponto... esta não me surpreendeu, mas a maioria do recinto ainda mastigava qualquer coisa...), e a primeira coisa que fez, foi cumprimentar o público... Básico, óbvio e lógico... mas porque é que os outros artistas não o fazem? Não conseguem ser humildes? Serão assim tão grandiosos ou importantes?... Ou meramente insignificantes quando comparados com este Grande Senhor?... Fez um intervalo a meio do espectáculo de 20 rigorosos minutos. Vejo muitos concertos, mas só vi isto ser feito uma vez: pelo Bruce Springsteen, em Alvalade, 1993.
O concerto que assisti é reflexo da música que o Grande Mestre compôs ao longo dos seus 40 anos de carreira: um espectáculo simples em que nada é deixado ao acaso. Tudo é resultado de um esforço de apuramento e aperfeiçoamento. Aqui não há inspirações esporádicas... há um trabalho contínuo de consistência, reflexão e sistematização. Não há espaço para improvisos ocorridos do nada... Tudo é construído, pensado e reflectido com o objectivo final de ficar tão próximo da perfeição quanto possível. O resultado é de tal coerência, que não posso apontar um ou outro tema como pontos altos do concerto... todo o encadeamento é tão interligado, que o espectáculo é um ponto alto de ponta a ponta. Uma constância de grandeza!
A carga emocional foi muito grande e acho que ainda não recuperei o meu descernimento por completo... Temas como Tower of Song, Hallelujah, If It Be Your Will, I'm Your Man, Suzanne, The Future, Bird on a Wire, Sisters of Mercy, Dance Me To The End of Love, So Long Marianne, The Stranger Song... enfim!... causaram um efeito na multidão, ao qual Leonard Cohen agradecia com frases sentidas e respeitosas como "...thank you! You sing so lovelly... you're so kind... thank you for your kind attencion...". Fez agradecimentos o concerto todo... agradeceu por termos vindo até ali, agradeceu os aplausos, os cânticos, as palmas, o país maravilhoso que temos, as pessoas simpáticas e bonitas, o cenário natural incrível onde tudo acontecia, e sentiu-se honrado por vir a um país com uma música e cultura tão bonita e especial como o nosso.
A grandeza deste homem leva a que elogie e agradeça aos excelente músicos que o acompanham, constantemente, ao longo da noite. No seu fato escuro e usando um chapeu escuro também, os gestos suaves e elegantes sucederam uns atrás dos outros. Não tenho dúvida em elegê-lo como a elegância em pessoa. Nunca imaginei existir alguém com uma presenção tão sedutora, tão elegante, tão acolhedora.
Aos 73 anos Leonard Cohen é o Mestre, o Senhor, o Grande, o Exemplo, a Elegância. Não necessários muito momentos para perceber isso na tranquilidade e constância do seu sorriso. Impressiona a sua destreza física; capaz de cantar em "cocaras" vários minutos, ou pular ao longo do placo com supless, elevando-se a mais de 20 cms do solo. A sua voz mantem-se igual ao que sempre conhecemos: plena de charme, envolvente, sedutoramente rouca, meiga em simultâneo e possante quando o pretende.
Convivo com uma sensação de bem-estar única desde Sábado... de bem com a vida... de tranquilidade... Parece que aprendi alguma coisa só em ver um concerto. Tudo corre bem a partir daquela presença... A viagem de regresso ao Porto foi óptima, a companhia excelente (já o tinha sido na ida... já agora, excelente Focus!); fui jogar futebol com algumas horas de sono, mas senti-me lindamente; passei um dia encantador com a família; hoje de manhã fui às Águas de Gaia fazer uma reclamação por me terem cortado a água indevidamente na empresa, com tão boa disposição, que ainda me agradeceram por o ter feito.
Se algum dia se cruzarem com Leonard Cohen, façam-lhe uma vénia de joelhos. É obrigatório! Eu, assim o farei.
Sérgio
9 comentários:
See... He's dressing black! Like me! Ohohoho!
até eu me arrepiei com a tua descrição...por momentos imaginei-me nesse ambiente, com esse som, com toda a magia que envolve os concertos de gente tão GRANDE.
Obrigada por teres partilhado...
Não imaginaria de outra forma e estava certa de ser algo inesquecivel para portugal !!
Apesar de ter estado longe e sem o puder ouvir, já marquei um encontro com este Ser Maravilhoso ;-)
Sabem que mais: quando for grande, quero ser como ele!
eu encontro-me exactamente assim...em extâse...ainda embalada por aquela noite que não deveria ter tido "fim"!
geralmente quando as expectativas são tão elevadas como as minhas, há quase sempre uma desilusão por qualquer detalhe em falta, não foi o caso...em tudo esta noite foi altamente superada!
Cohen, é aquele "tio" que emigrou quando ainda não tinha nascido, mas viveu sempre presente lá em casa, entre discos e livros...concertos em VHS, do canal 2, aquele homem, que é o 2º homem da minha vida, porque o 1º é o meu pai, Cohen veio antes dos namorados, das melhores amigas e até das manas...Cohen, é aquele homem que me faria trocar tantos outros momentos da vida, por uma só noite a ouvi-lo falar...um sonho, que não guardo no baú, mas que sei jamais realizável...contudo, para sempre desejado...
o teu post está fantástico e de uma veracidade emocional, que será seguramente o reflexo onde muitos que lá estiveram se podem ver, como eu!
obrigada pela partilha!;)
"Convivo com uma sensação de bem-estar única desde Sábado... de bem com a vida... de tranquilidade... Parece que aprendi alguma coisa só em ver um concerto."
e se alguma vez te cruzares com este grande Mestre, depois da Vénia, faz-me um favor, send him my best regards!!!
So Long ;)
Olá & obrigada pela vista e pelas tuas palavras;) espero sinceramente que voltes mais vezes, ao meu espaçoe que também é teu ;)!
Quanto ao Sr. Bonifácio, depois do teu comentário, e por também gostar de Perry Blake, (que não soube que tinha estado em VNF), ele deve curtir mesmo é Júlio Iglésias...vá, não ouvi o Acústico do Perry, nem sou conhecedora de Júlio Iglesias, (para além de que dança com a mão no abdomén, num aconchego só seu)...não imagino possível comparação, entre o Julito e o Perry e o Julito e o Grande Mestre...ainda que gostos não se discutam...comparações, são constatações, pouco ou nada têm de subjectividade...
e um grande saravá para ti e para o teu pai!!!
So long, S.
De facto, excelente.
Mesmo não sendo fã, é impossivel ficar indiferente à vitalidade e dinamismo daquele ser humano.
"Excelente focus", mas o condutor também ajudou :)
beijinhos.
Paula
Deve ter sido espectacular.
Tenho pena de não ter ido ver.
Eia! O Melão anda por estes lados!
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