31 dezembro 2008

2009, o Ano da Sereia!


2008 chega ao fim e fácil seria inúmerar o que correu mal e as desgraças, tragédias, a suposta crise... enfim! Felizmente, por muito mau que tenha sido o ano, só me lembro das coisas boas que nele vivi... e são essas que quero reter... afinal, somos aquilo que pensamos! E como o que ouvimos, influencia o que pensamos, não quero sequer ouvir a minha consciência a dizer inutilidades... Os outros é fácil calar, agora a nossa consciência pode ser mais delicado... requer treino!

Acreditar em nós próprios leva-nos até ao infinito. Por outro lado, acreditar que falhamos em determinado momento, implica terminar a nossa jornada. A característica mais notável de todos nós, pessoas de sucesso, é a de nunca, nunca, alimentarmos pensamentos de fracasso.

De cada vez que um ano se esgota e que outro aparece, pomos num prato da balança os 365 dias passados, e no outro, os 365 dias que nascem... e vemos para qual dos lados pende a balança. Não tenho dúvidas que neste acerto de contas, muitos são os que teimam em ter um passado pesado... E é claro que outros há também, com pratos que pendem ao contrário. 2009 não será um ano fácil, isso é certo; mas não mais difícil que os anteriores. Será um ano melhor e de mudança, e com esta virão certamente oportunidades e coisas boas, que colheremos mais à frente, se as soubermos semear e aproveitar. Por isso, para que tenhamos esperança fundada em prósperos anos vindouros, desejo a todos, desde já, um 2009 cheio de mudanças e felicidades.

Lembrem-se que o Pai Natal só vem uma vez por ano... mas nós estamos cá todos os dias! O melhor do ano não está na noite que Natal... mas em preparar o Natal ao longo do ano. A festa não é a da noite da passagem de ano, mas sim a forma como vivemos o ano inteiro... os 365 dias... esses é que são a verdadeira festa!

Não sou uma pessoa espiritual... as pessoas distinguem-se e valem pelo incorpóreo e invisível que têm dentro de si (e independentemente da embalagem exterior), mas quando morremos tudo se esvai... Por isso, há que aproveitar ao máximo todos os momentos que estamos vivos; é quase, viver como se não houvesse amanhã e fazer tudo o que podermos para que a vida não passe por nós, mas nós por ela. Há um peso que nunca vou carregar... e até já o carreguei no passado... o de me arrepender pelo que não fiz! Prefiro fazer tudo que está ao meu alcance... mesmo asneiras... Também não sou muito de olhar para trás, mas quando o faço, e mesmo percebendo o que poderia ter feito melhor (e é sempre muito!), dificilmente me arrependo... Por vezes arrependo-me da forma, mas o conteúdo inevitavelmente teria de ser aquele.

Não sendo espiritual, não sou fã de horóscopos... nem do zodíaco, nem do chinês... apesar de achar que este último faz bem mais sentido que o primeiro (mas gosto dos mapas astrais!). Por isso, e com base no pouco crédito que este me proporciona, decreto que 2009 seja o "Ano da Sereia"! Será um ano caracterizado por sucesso na vida profissional de todos os que são empreendedores, e de realização afectiva daqueles que acreditam nos sentimentos como forma de vida... daqueles que são capazes de tratar os outros como gostariam de ser tratados, e independentemente da quantidade de pontapés, rejeições e desconsiderações de que são alvo todos os dias.

Os últimos tempos têm sido de falta de inspiração por estes lados... Não sou de ferro... E algumas grandes contrariedades, quer profissionais, quer afectivas, acabam por me retirar capacidade criativa... por isso, os textos são substituídos por letras e músicas, onde me revejo. Mesmo o texto de hoje, está cheio de passagens que li algures... qualquer semelhança é pura realidade!

A música tem esse dom... de me fazer reviver momentos felizes, enaltecer sentimentos que privilegio. A combinação entre letras e sons, apregoa o contexto emocional que o nosso imaginário revê... só a letra, seria incapaz... até porque por mim não havia sido escrita.

Tudo isto combate o tal estado de desilusão ou fracasso com que tantas vezes sou confrontado... A solução não está em evitar esses estados, muito menos as situações que a estes conduzem; a solução está em revertê-los rapidamente, ou instantâneamente se possível. Sem medo... sempre sem medo! Somos sempre capazes de os reverter... se não fosse o medo a bloquear-nos, tal o faríamos quase inconscientemente... Mas por vezes complicamos e permitimos que o medo se apudere de nós... Se não fossemos tão racionais, agiríamos instintivamente: um rato decide sempre em sem favor... instântaneamente... instintivamente... nunca hesita entre continuar a viver ou desistir. Claro que as suas opções de vida são mais básicas... A solução está em agir racionalmente e pensar: se eu não tivesse medo, como reagiria? Rapidamente concluíremos que aquilo que receamos nunca é tão mau quanto nós estimávamos... rapidamente nos apercebemos que o medo que permitimos que se gere no nosso pensamento é muito mais nocivo do que a situação em si... É que o medo aumenta quando nada se faz... Mas ultrapassar um medo é uma sensação agradável... mostra-nos o que de melhor há dentro de nós!

Há frases que saiem das músicas e que expressam bem qual é a nossa direcção... querer revertê-lo é querer viver morto... A acreditem que isso se torna mais penoso do que morrer de vez! Afinal, todos diferentes, mas no fundo, todos iguais...

Como cantavam Jennifer Warnes e Joe Cocker nos "ridículos" anos 80 "...love lifts us up to where we belong..."... é ridículo contrariar isto... afinal, o amor não é o queremos sentir, mas o que sentimos sem querer!

Há uns dias atrás recebi um email com esta mensagem (obrigado Paula!).

"Rios de amor para os meus amigos... Feliz ano novo para todos!

Dentro de alguns dias, um Ano Novo vai chegar a esta estação. Se não puderes ser o maquinista, sê o seu mais divertido dos passageiros. Procura um lugar próximo à janela, desfruta cada uma das paisagens que o tempo te oferecer, com o prazer de quem realiza a primeira viagem. Não te assustes com os abismos, nem com as curvas que não te deixam ver os caminhos que estão por vir. Procura desfrutar a viagem da vida, observando cada arbusto, cada riacho, os beirais de estrada e os tons mutantes de paisagem. Desdobra o mapa e planeia roteiros. Presta atenção a cada ponto de paragem e fica atento ao apito da partida. E quando decidires descer na estação onde a esperança te acenou, não hesites... Aventura-te e desembarca nela os seus sonhos...

Desejo que a tua viagem pelos dias do próximo ano, seja de PRIMEIRA CLASSE!"

Nem por coincidência, a ANTENA3 passava "Quando eu te falei amor" do André Sardet, onde se pode ler/ouvir:

"...Quando eu te falei em amor
Nós sentimos os dois
Que o amanhã vem depois
E não no fim..."

Entrei num sonho por entre centenas de músicas que me vieram à mente... E o fundamento base das letras é sempre o mesmo (e não precisam de ser lamechas ou melodramáticas! eheheh!).

Se meio distraído estava... de um momento para o outro, tudo o que lêmos, ouvimos, dizemos está interligado... o fundamento é sempre o mesmo... Todo o ser humano gosta e precisa de ser reconhecido e as necessidades afectivas são as prioritárias. São estas que são capazes de gerar maior quantidade de adrenalina e desencadear todos os que são os nossos maiores feitos. Portanto, vamos contrariar o quê?! Tapar o sol com a peneira e armarmo-nos em independentes e altruístas para quê?! Enganarmo-nos a nós próprios, mesmo que consigamos enganar os outros, porquê?!

Esta viagem pelo meu imaginário terminou interrompida novamente pela ANTENA3, desta vez com o Pedro Abrunhosa e "Quem me leva os meus fantasmas?":

"Aquele era o tempo
Em que as mãos se fechavam
E nas noites brilhantes as palavras voavam,
Eu via que o céu me nascia dos dedos
E a Ursa Maior eram ferros acesos.
Marinheiros perdidos em portos distantes,
Em bares escondidos,
Em sonhos gigantes.
E a cidade vazia,
Da cor do asfalto,
E alguém me pedia que cantasse mais alto.

Quem me leva os meus fantasmas,
Quem me salva desta espada,
Quem me diz onde é a estrada?

Aquele era o tempo
Em que as sombras se abriam,
Em que homens negavam
O que outros erguiam.
E eu bebia da vida em goles pequenos,
Tropeçava no riso, abraçava venenos.
De costas voltadas não se vê o futuro
Nem o rumo da bala
Nem a falha no muro.
E alguém me gritava
Com voz de profeta
Que o caminho se faz
Entre o alvo e a seta.

Quem leva os meus fantasmas,
Quem me salva desta espada,
Quem me diz onde é a estrada?

De que serve ter o mapa
Se o fim está traçado,
De que serve a terra à vista
Se o barco está parado,
De que serve ter a chave
Se a porta está aberta,
De que servem as palavras
Se a casa está deserta?

Quem me leva os meus fantasmas,
Quem me salva desta espada,
Quem me diz onde é a estrada?"

Bem... acho que já chega de devaneio... já escrevi hoje pelo mês inteiro (ehehe! rimou!). Tenho consciência que não tenho os parafusos todos bem apertados (pelo menos, a minha mãe todos os dias faz questão de mo lembrar...), portanto, não liguem muito a tudo isto, mas sejam felizes, porque assim eu também serei um bocadinho mais!

Despeço-me com a seguinte mensagem, que é realmente o que vos desejo a todos em 2009 (também esta plagiada... Obrigada CristinaXX!):

"...nesta época belíssima, toda a gente deseja paz, saúde, amor, blá, blá, blá... uma porrada de farsas e discursos! O que eu te desejo de todo o coração é que tenhas relações sexuais incriveis, orgasmos bombásticos, muito sexo inesquecível! Que trabalhes metade e ganhes o triplo deste ano! 1000 noites de prazer e festas de arromba com os amigos! Que te saia o euromilhões, que faças férias fabulásticas, compres uma super mansão nova, troques o teu bólide por um Ferrari, troques a tua moto por outra ainda melhor! Que explodas de alegria em 2009! Feliz Ano Novo!"

Sérgio

30 dezembro 2008

...para mim ainda é Natal...

...enquanto há vida há esperança! E seguramente a vida gira à nossa volta... nem me passa pela cabeça permitir que corra ad-hoc e sem meu controlo sobre os acontecimentos... é preciso é fazer por isso: para que seja como nós queremos... da forma que mais nos faça feliz! Pelo menos no que estiver ao meu alcance, tudo farei para que seja o mais possível em torno de mim...

Sérgio



All I want for Christmas is you
You're the gift that's made my dreams all come true
All I need for Christmas is here
Finding every sweet surprise wrapped up in your eyes
Waiting there for me
Underneath the tree

We'll spend the day
Exchanging kisses
Smile and say
"What a Christmas this is"

Long before the snowflakes appear
Without bells and mistletoe
Or the tinsel's silver glow
You just look at me and oh - Christmas is here

Long before the snowflakes appear
Without bells and mistletoe
Or the tinsel's silver glow
You just look at me and oh - Christmas is here


(A Christmas Love Song - Manhattan Transfer)

27 dezembro 2008

Realize...

Take time to realize,
That your warmth is
Crashing down on in.
Take time to realize,
That I am on your side
Didn't I, Didn't I tell you.

But I can't spell it out for you,
No it's never gonna be that simple
No I cant spell it out for you

If you just realize what I just realized,
Then we'd be perfect for each other
and will never find another
Just realized what I just realized
we'd never have to wonder if
we missed out on each other now.

Take time to realize
Oh-oh I'm on your side
didn't I, didn't I tell you.
Take time to realize
This all can pass you by
Didn't I tell you

But I can't spell it out for you,
no it's never gonna be that simple
no I can't spell it out for you.

If you just realized what I just realized
then we'd be perfect for each other
then we'd never find another
Just realized what I just realized
we'd never have to wonder if
we missed out on each other now.

It's not always the same
no it's never the same
if you don't feel it too.
If you meet me half way
If you would meet me half way.
It could be the same for you.

If you just realize what I just realized
then we'd be perfect for each other
then we'd never find another
Just realize what I just realized
we'd never have to wonder
Just realize what I just realized

If you just realize what I just realized

missed out on each other now
missed out on each other now

Realize, realize
realize, realize.

(Colbie Caillat, Realize)



Sérgio

26 dezembro 2008

O Espírito de Natal...

...afinal há algo de diferente entre esta noite e as outras 364... e pelos vistos não sou o único a dizê-lo...

Sérgio


HOJE É NATAL

O avô Fernando chegou de longe com uma mala muito pesada. Ajudei-o a levá-la para o meu quarto e não o larguei mais, enquanto não a abriu. O que traria ele dentro daquela mala tão grande? Prendas de Natal? Surpresas? Brinquedos? Livros? – perguntava a mim próprio. Mortinho de curiosidade, andei à sua volta como uma mosca, a zumbir perguntas.

— Ó avô, o que é que trazes?

— Tem calma, tem paciência, que logo te mostro! – aconselhou, ainda com a voz ofegante por ter carregado comigo aquela mala.

— Anda lá, diz-me só a mim, que eu não digo a mais ninguém!

— As prendas e as surpresas só se mostram logo, depois da ceia. Não sejas chato!

— Diz-me, que eu prometo guardar segredo! – insisti.

Como tinha de entregar à minha mãe uns produtos para a ceia, que tinha trazido da sua terra, começou a abrir a mala devagarinho e eu fiquei à espera que de lá de dentro saísse qualquer coisa de mágico: um avião que voasse – vrrruuum, vrrruuummm – ou uma coisa assim... capaz de fazer pasmar os meus amigos.

Mas não. Apareceram, entre a escova de dentes, a gilete, o pincel da barba, uma toalha de rosto e o pijama do meu avô, vários embrulhinhos amarrados com fitas coloridas, uma garrafa de azeite, um queijo, uma broa de Avintes, um frasco de azeitonas e uma garrafa que parecia ter dentro água amarela.

— Avô, que prenda me vais oferecer?

— Que prenda me vais dar a mim?

Não lhe respondi. A um canto, estava um rolo envolvido em papel azul-marinho, prateado.

— E isso, o que é? É um telescópio? É um caleidoscópio?

— Olha que tu és muito pegajoso! Está bem, pronto! Eu digo-te, se não, nunca mais te calas. Isso é uma luz para o Natal!

— É de ligar à electricidade? É de acender? É uma estrela para pôr no presépio? – perguntei, agitado.

— Não. Isto é o Espírito do Natal! – exclamou o meu avô, com mistério na voz.

— Espírito? Igual àquele da Lâmpada do Aladino? Se esfregar, sai um génio que faz tudo o que a gente quer? Ó avô és mesmo fixório! Mostra, avô, mostra!

Para não me aturar mais, ele ia a desembrulhar o rolo de papel prateado, quando foi salvo da minha curiosidade pelo chamamento da minha mãe:

— Venham para a mesa!

O meu avô, ainda a arfar da viagem, desceu devagar com a mão no corrimão, e eu acompanhei-lhe os passos.

O meu pai fechou-se na sala de jantar e, querendo fazer um bonito, não nos deixou entrar na sala, onde a mesa já estava posta para a ceia.

As luzes estavam apagadas e a porta fechada. Quando íamos para entrar, o meu pai, muito teatreiro e eufórico, fez:

— Te te te tzzéééé! ! ! – e abriu a porta e as luzes.

Senti uma baforada quente e fui abraçado por um cheirinho a rabanadas, a sonhos, a filhoses, a aletria com desenhos de canela e a bilharacos, que era um doce que o meu avô apreciava muito.

A iluminação da sala estava um espanto, a mesa um espectáculo, a lareira soltava línguas de fogo e a música ambiente eram as vozes de anjos de um CD que a minha mãe comprara de propósito para aquela noite.

Por cima da lareira, o meu pai pôs o presépio e ao canto construiu uma Árvore de Natal, apenas com ramos de pinheiro, porque pensava ele que as árvores não se deviam abater.

Disse-me uma vez:

— Se um dia tiveres de cortar uma árvore, deves pedir-lhe desculpa, ouviste? Uma árvore é um ser vivo!

O meu avô dirigiu-se ao presépio, mirou-o e remirou-o e, por fim, disse:

— Que engraçado! Nunca vi um presépio assim: o Menino Jesus está ao colo da mãe e a manjedoura vazia. Ó Castro, dou-te os meus parabéns, o presépio está muito bonito!

Os olhos do meu pai brilharam com o elogio.

E sabem porquê? É que o meu avô achava que o meu pai era um bocado azelhote para fazer coisas e habilidades com as mãos.

Era a primeira vez que ele vinha a nossa casa, depois do segundo casamento da minha mãe.

Para o impressionar, os meus pais receberam-no com mimos e atenções como se fosse um rei.

Por causa disso, eu comecei a ficar um bocado chateado. Até parecia que os meus pais, naquela noite, decidiram riscar-me do mapa das suas atenções.

Mas não, para mim, aquele Natal não foi só uma noite de paz, foi uma noite de pazes.

— Ah, já me esquecia... Olha, Mário, vai à minha mala buscar o Espírito do Natal, mas trá-lo com cuidado, não lhe mexas, ouviste? – pediu-me o avô Fernando.

O meu pai e a minha mãe cruzaram os olhos de interrogação, ao saber que o meu avô tinha trazido para casa um espírito.

Subi a correr as escadas que davam para o meu quarto e senti que os bichos carpinteiros da curiosidade me atacavam com perguntas:

— O que estaria dentro daquele rolo de papel prateado? Seria mesmo um espírito? E os espíritos têm a forma de um charuto comprido? Seria uma brincadeira ou uma história do meu avô? Pelo sim e pelo não, passei os dedos, ao de leve, pelo rolo.

E se o tal espírito saísse do tubo e me falasse: "Diz-me, Mário, meu amo, que desejas? Diz-me, que a tua vontade será satisfeita!"

Se isso me acontecesse, o que é que eu desejaria? Sei lá, se não ficasse atrapalhado, era capaz de pedir:

— Ó alma boa, ó espírito da luz, quero que arranjes alguém que me faça os deveres de casa, quero um avião a sério que aterre no meu pátio e quero uma moto a motor!

Estava a minha imaginação com gás na tábua quando ouvi a voz do meu avô:

— Então, vens ou não?!

Desci as escadas a correr e entreguei-lhe o rolo de papel prateado. Fiquei à espera, para ver o que de lá saía.

Era agora, era agora que eu ia conhecer o tal Espírito do Natal. Como o avô desembrulhou o rolo com muito cuidadinho, eu comecei a acreditar que, se calhar, havia ali mesmo qualquer mistério.

Desenrolou, desenrolou, até que… apareceu uma simples vela de cera branca.

— Oooohhhh! Uma vela! – disse de mim para mim, muito desiludido.

Embora a sala estivesse inundada de luz, o avô Fernando riscou um fósforo, pediu à minha mãe um castiçal, acendeu a vela e colocou-a no centro da mesa. Depois, disse:

— Na chama desta vela mora o Espírito do Natal! Nesta noite, nesta mesa e nesta chama, para mim estarão presentes todos os nossos antepassados, todas as nossas recordações e todas as pessoas de quem gostamos. Está o meu pai e a minha mãe, está a tua... está a tua... avó que Deus tenha...

O meu avô parou de falar e, em vez de palavras, saíram apenas lágrimas grossas que escorreram pela cara abaixo.

O silêncio que se fez foi tão grande que ficámos todos muito encolhidos, sem saber o que dizer.

Quem nos salvou do peso do silêncio e das lágrimas foi a minha mãe:

— Então, então, pai, hoje é Natal! – falou baixinho a minha mãe, misturando a fala com um beijo.

— Vamos à ceia! – disse, por fim, o avô, ainda com a coragem engasgada.

Depois, comemos, rimos, jogámos ao rapa, ao tira, ao deixa e ao põe até que chegou a hora da distribuição das prendas.

O meu pai deu-me um livro, a minha mãe uma camisa aos quadrados e o meu avô umas grossas meias de lã.

Eu fiquei muito desconsolado porque esperava um brinquedo de espanto, daqueles que fizessem roer de inveja os colegas da rua. O meu avô andava sempre com os pés frios e trouxe meias de lã porque, se calhar, pensou que sofríamos todos do mesmo mal.

Estava tudo a correr bem. Até o meu pai, que andava quase sempre, "cabisbundo" e "meditabaixo", ria-se, ria-se até mais não. A certa altura, o avô chamou-me para a sua beira e disse-me:

— Olha para a luz da vela. Fixa o Espírito do Natal! O que vês? Eu lá olhei, mas o que via era que a chama se inclinava, lenta mente, ora para um lado, ora para o outro.

— Vês alguma coisa?

— Não vejo nada. Só a chama a dizer não, devagarinho!

— Para mim, na Noite de Natal, esta chama significa tudo o que o ser humano tem de bom dentro de si: a saudade do amor, da amizade e da partilha das coisas. É por isso que lhe chamo o Espírito do Natal. Nesta noite, quando fixo a luz da vela, diante dos meus olhos passam, como se fosse em cinema, histórias e vidas das pessoas que amei e se cruzaram comigo ao longo dos anos.

Estou agora a olhar para ela e estou a lembrar-me do Natal mais lindo que eu tive em toda a minha vida. Queres que te conte?

— Conta, avô, conta!

— Mas olha que é uma história triste! Mas verdadeira!

— Não faz mal! Mesmo assim, conta!

A minha mãe e o meu pai aproximaram-se do sítio onde nós estávamos. O avô fixou os seus olhos de formiga na chama da vela e, com uma voz quente e pausada...

— No tempo em que o Natal custava a chegar, vivia eu numa casa pequenina. Eu era pobre e não tinha brinquedos, mas não me importava. Bastava o cheiro que andava pelas ruas e pelos caminhos a fazer miminhos de fraternidade no coração das pessoas.

Era por isso que, quando tinha a tua idade, na véspera de Natal, ao passar pelas outras pessoas, dizia, cheio de alegria:

— Hoje é Natal!

A pouca distância de minha casa, havia uma outra, que não era bem casa. As paredes eram de chapa velha e o chão de terra batida.

O vento entrava por tudo o que era frincha e o frio estava ali plantado.

Uma fogueira fazia de fogão e a única cama que havia era feita de paus de pinheiro, ainda por descascar.

E nessa casa que não era bem casa, tão pequenininha e tão pobre de tudo, morava a Ti Adelaide Tintureira e os seus filhos: a Rosa e o Domingos.

Esta mulher de pele enrugada, de olhos verdes e vida amargurada foi, um dia, transformada em pássaro negro. Por duas vezes se quis matar, atirando-se da ponte de D. Luís para o rio Douro.

Da primeira vez, as saias largas que usava amorteceram a queda e um barqueiro que por ali andava viu-a e, remando rapidamente, retirou-a do rio, ainda com vida.

Da segunda vez que se quis matar estava muito vento. Ao atirar-se da ponte, uma rajada empurrou-a contra os fios de electricidade e neles ficou enrodilhada. Os bombeiros tiraram-na com vida, apenas ficando magoada no peito.

Disseram as velhas da aldeia que tudo isso aconteceu porque o Anjo da Guarda da Ti Adelaide Tintureira, cansado de a proteger durante uma vida cheia de aflições, adormeceu duas vezes.

E, nessas duas vezes, a Morte, ao ver aquela mulher de olhos tristes, transformada em ave negra, não a quis e devolveu-a, sã e salva, para viver o resto do seu destino.

Naquele tempo, a Ti Adelaide Tintureira e os filhos viviam da venda da lenha, apanhada nos pinhais, e de pequenos serviços que lhe encomendavam. Ela e os filhos vestiam do que algumas "almas caridosas" lhe davam.

Passavam muito mal e, quando se vive assim, nem é bom sentir o cheiro do Natal nem ouvir falar de prendas nem de rabanadas. Isso só serve para entristecer a vida de quem tem pouquinho.

— Natal é um dia como os outros! – dizia a Ti Adelaide Tintureira para tentar convencer os filhos a não olharem para as roupas novas que os outros meninos vestiriam no dia seguinte.

Na noite de Natal, em cima da nossa pequena mesa, já fumegava a travessa de bacalhau cozido com batatas e couves-galegas.

Nesse ano, para além das rabanadas, havia um bocadinho de queijo, uns pastéis comprados no Porto e uma garrafa de vinho fino, oferecida pelo Ti Zé Estureta, como consoada, por lhe gastarmos da mercearia.

Para operários de vida dura, aquela ceia de Natal era quase um banquete de rei.

Quando íamos iniciar a refeição da noite de Natal...

— E se fôssemos chamar a Ti Adelaide Tintureira e os seus filhos para cearem com a gente? – propôs o meu pai.

A minha mãe disse que sim e, momentos depois, eu batia à porta da barraca da Ti Adelaide Tintureira.

Lá dentro, a chama da candeia de azeite furava a escuridão e os olhos da Rosa e do Domingos enchiam de tristeza aquela noite, que não era bem igual às outras.

Sem saber o que dizer nem fazer, seguiram-me até à porta da minha cozinha.

Disseram boa noite com voz sumida e, quando se sentaram à volta da mesa daquela família de pobres operários, que era a minha, dei com uns olhos verdes, acesos de alegria.

Eram os da Ti Adelaide Tintureira que pagava aquele gesto bonito com um olhar que já não usava há muito tempo: um olhar de felicidade.

Quando acabámos de comer e de jogarmos o rapa a pinhões, vim cá fora e, pelo intervalo das folhas de uma laranjeira, vi, lá longe, o brilho de uma estrelinha que mais ninguém viu.

Agora, quando olho para o céu, lembro-me dos olhos acesos da Ti Adelaide Tintureira, que foram morar para as estrelas e que me aparecem, na noite de Natal, para me recordarem dos bons sentimentos que ainda não foram apagados do coração das pessoas.

Quando o avô Fernando se calou, olhei para a chama da vela e senti que o Espírito do Natal estava ali e me tinha visitado naquela noite.


José Vaz, Hoje é Natal, Ed. Gailivro, 2000

25 dezembro 2008

We All Stand Together!

A verdadeira musica de Natal!

Sérgio



(We all stand together - Paul McCartney)

23 dezembro 2008

Hallelujah...

...dadas as reclamações pela falta de uma mensagem natalícia neste blog, aqui fica o meu melhor... eheheh!

Feliz Natal a todos!

Sérgio



Now I've heard there was a secret chord
That David played, and it pleased the Lord
But you don't really care for music, do you?
It goes like this
The fourth, the fifth
The minor fall, the major lift
The baffled king composing Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah
Hallelujah

Your faith was strong but you needed proof
You saw her bathing on the roof
Her beauty and the moonlight overthrew you
She tied you
To a kitchen chair
She broke your throne, and she cut your hair
And from your lips she drew the Hallelujah

Baby I have been here before
I know this room, I've walked this floor
I used to live alone before I knew you.
I've seen your flag on the marble arch
Love is not a victory march
It's a cold and it's a broken Hallelujah

Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah

There was a time you let me know
What's really going on below
But now you never show it to me, do you?
And remember when I moved in you
The holy dove was moving too
And every breath we drew was Hallelujah

Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah

You say I took the name in vain
I don't even know the name
But if I did, well really, what's it to you?
There's a blaze of light
In every word
It doesn't matter which you heard
The holy or the broken Hallelujah

Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah

I did my best, it wasn't much
I couldn't feel, so I tried to touch
I've told the truth, I didn't come to fool you
And even though
It all went wrong
I'll stand before the Lord of Song
With nothing on my tongue but Hallelujah

Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah, Hallelujah
Hallelujah

(Hallelujah, Leonard Cohen)

The Rose...

Este é mais dos temas que fui buscar ao baú do meu imaginário de miúdo, com o meu Pai a colocar o vinil no gira-discos, enquanto eu me mantinha hipnotizado pelo movimento giratório do rótulo verde e laranja, refletido na tampa do gira-discos.
Conheci este tema pela B.S.O. do filme com o mesmo nome, numa interpretação de Bette Midler. Sempre lhe associei o tom natalício... razão pelo qual (também) o fui buscar agora. Mais tarde descobri que se tratava de um original de Janis Joplin; mais tarde também descobri o significado da letra... Agora até descobri que há uma boys band (Westlife) com uma versão bem estereotipada de balada pop norte americana para este tema. Dá umas certas náusesas, mas curiosamente, o tema é tão profundo, que nem assim não se desvirtuou...


Some say love it is a river
that drowns the tender reed
Some say love it is a razer
that leaves your soul to blead
Some say love it is a hunger
an endless aching need
I say love it is a flower
and you it's only seed
It's the heart afraid of breaking
that never learns to dance
It's the dream afraid of waking
that never takes the chance
It's the one who won't be taken
who cannot seem to give
and the soul afraid of dying
that never learns to live
When the night has been too lonely
and the road has been too long
and you think that love is only
for the lucky and the strong
Just remember in the winterfar
beneath the bitter snows
lies the seed
that with the sun's love
in the spring
becomes the rose...
(The Rose - Janis Joplin)


Sérgio

To Make You Feel My Love...

A minha paixão obsessiva pela música, advém do complemento das palavras e sons transmitirem aquilo que não conseguimos exprimir racionalmente... por muito que tentemos... nunca dizemos tudo o que queríamos... tudo o que pensamos... tudo o que sentimos. Exprimir emoções está além da nossa capacidade de as transcrever em palavras.

Aqui fica um exemplo...


When the rain is blowing in your face,
and the whole world is on your case,
I could offer you a warm embrace
to make you feel my love.

When the evening shadows and the stars appear,
and there is no one there to dry your tears,
I could hold you for a million years
to make you feel my love.

I know you haven't made your mind up yet,
but I would never do you wrong.
I've known it from the moment that we met,
no doubt in my mind where you belong.

I'd go hungry; I'd go black and blue,
I'd go crawling down the avenue.
No, there's nothing that I wouldn't do
to make you feel my love.

The storms are raging on the rolling sea
and on the highway of regret.
Though winds of change are throwing wild and free,
you ain't seen nothing like me yet.

I could make you happy, make your dreams come true.
Nothing that I wouldn't do.
Go to the ends of the Earth for you,
to make you feel my love...

(Adele - To Make You Feel My Love - um original de Bob Dylan, 1977)

Sérgio

20 dezembro 2008

Quando é a Alma a Falar...

... e não o corpo!



Por mais que a vida nos agarre assim
Nos troque planos sem sequer pedir
Sem perguntar a que é que tem direito
Sem lhe importar o que nos faz sentir

Eu sei que ainda somos imortais
Se nos olhamos tão fundo de frente
Se o meu caminho for por onde vais
A encher de luz os meus lugares ausentes

É que eu quero-te tanto
Não saberia não te ter
É que eu quero-te tanto
É sempre mais do que te sei dizer
Mil vezes mais do que eu te sei dizer

Por mais que a vida nos agarre assim
Nos dê em troca do que nos roubou
Às vezes fogo e mar, loucura e chão
Às vezes só a cinza que sobrou

Eu sei que ainda somos muito mais
Se nos olhamos tão fundo de frente
Se a minha vida for por onde vais
A encher de luz os meus lugares ausentes

É que eu quero-te tanto
Não saberia não te ter
É que eu quero-te tanto
É sempre mais do que te sei dizer
Mil vezes mais do que eu te sei dizer

(Imortais - Mafalda Veiga, Chão, 2008)


Sérgio

17 dezembro 2008

You're My Home

É outro dos meus temas favoritos, que sai regularmente do "sótão" lá de casa, para me reconfortar no sofá...

Sérgio


When you look into my eyes
And you see the crazy gypsy in my soul
It always comes as a surprise
When I feel my withered roots begin to grow
Well I never had a place that I could call my very own
That's all right, my love, 'cause you're my home
When you touch my weary head
And you tell me everything will be all right
You say, "Use my body for your bed
And my love will keep you warm throughout the night"
Well I'll never be a stranger and I'll never be alone
Whenever we're together, that's my home
Home can be the Pennsylvania Turnpike
Indiana's early morning dew
High up in the hills of California
Home is just another word for you
Well I never had a place that I could call my very own
That's all right, my love, 'cause you're my home
If I travel all my life
And I never get to stop and settle down
Long as I have you by my side
There's a roof above and good walls all around
You're my castle, you're my cabin and my instant pleasure dome
I need you in my house 'cause you're my home.
You're my home.

(Billy Joel - Piano Man, 1973)

http://www.youtube.com/watch?v=c4D40r-E7yk

11 dezembro 2008

Love Is Where You Are...

Esta é a melodia que me acorda, acompanha o dia e adormece... Já a imagem...


I used to walk between the shadows
Lost in a world that moved too fast
I was afraid I'd always be alone
Then I saw your face at last
I found my way even in the dark
Though at times it seemed too far
I knew if I'd listen to my heart
I'd find that love is where you are
I close my eyes and see tomorrow
My dreams begin and end with you
I hear you say you'll be there
Always be thereI must believe it's true
I found my way even in the dark
Though at times it seemed too far
I knew if I'd listen to my heart
I'd find that love is where you are
Love is where you are
And anywhere you are
Is where I want to be
No matter what may happen
No matter where I go
Your arms are home to me
I found my way even in the dark
Though at times it seemed too far
Somehow I knew even at first sight
That love is anywhere you are
Love is where you are
Love is where you are

(Diana Krall, Love Is Where You Are - B.S.O. At First Sight) http://vodpod.com/watch/144318-diana-krall-love-is-where-you-are


Sérgio

08 dezembro 2008

A Noite Passada...


A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste
A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos
A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste"

(Sérgio Godinho - A Noite Passada)



Sérgio

05 dezembro 2008

Captain Jack

Cresci a ouvir este tema de Billy Joel. Para mim é quase um hino... Conheci-o não na versão original, mas ao vivo, gravada no disco "Songs in de Attic". Lembro-me perfeitamente do meu Pai pegar neste espectacular vinil de 180g, importado dos EUA, cuja qualidade de som é capaz de nos abanar tudo cá dentro (além da estrutura da casa!).

Se os temas de Billy Joel nas versões originais sofrem de alguma apatia, ao vivo caracterizam-se pelo oposto... Chega-se a ouvir mais a assistência que os instrumentos tocados ao rubro. Enquanto isso, já estamos corados e a transpirar sem termos tempo de nos apercebermos.



"Saturday night and you're still hangin' around
You're tired of livin' in your one horse town
You'd like to find a little hole in the ground for a while

So you go to the village in your tie-dye jeans
And you stare at the junkies and the closet queens
It's like some pornographic magazine, and you smile

But Captain Jack will get you high tonight
And take you to your special island
Captain Jack will get you by tonight
Just a little push 'n' you'll be smilin'
Oh yeah, yeah

Your sister's gone out, she's on a date
And you just sit at home and masturbate
Your phone is gonna ring soon,
But you just can't wait, for that call

So you stand on the corner in your new English clothes
And you look so polished from your hair down to your toes
But still your fingers gonna pick your nose, after all

But Captain Jack will get you high tonight
And take you to your special island
Captain Jack will get you by tonight
Just a little push 'n' you'll be smilin'
Oh yeah, yeah

So you decide to take a holiday
You got your tape deck and your brand new Chevrolet
Ah, but there's no place to go anyway and what for
You've got everything, but nothin's cool
They just found your father in the swimming pool
And you guess you won't be going back to school anymore

But Captain Jack will get you high tonight
And take you to your special island
Captain Jack will get you by tonight
Just a little push 'n' you'll be smilin'
La da, da
Oh yeah, yeah

So you play your albums and you smoke your pot
And you meet your girlfriend in the parking lot
Oh, but still you're aching for the things you haven't got,
What went wrong

And if you can't understand why your world is so dead
And why you've got to keep in style and feed your head
Well, you're twenty one and still you mother makes your bed
And that's too long

But Captain Jack will get you high tonight
And take you to your special island
Captain Jack will get you by tonight
Just a little push 'n' you'll be smilin'
Yeah, Captain Jack will get you by tonight
Yeah, Captain Jack will get you by tonight"


Sérgio

01 dezembro 2008

2 dias de férias!

...no Verão passado, que por muito pouco que tenham sido, cortaram o cansaço, a rotina e trouxeram novas histórias para contar. Nem que fosse só pela viagem... já tinha valido a pena!

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Assim, prometi a mim mesmo, que não ia trabalhar uma quinta e uma sexta. Empresa nova é mesmo assim, mas lá consegui com a equipa resolver isto... afinal, ninguém é insubstituivel.

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Quinta de manhã acordei quando acordei... tinha pensado sair às 10 da manhã, mas já não era possível... Saí às 11 e reconheço que estava um dia de praia tão bom, que já não me apetecia sair. Despedi-me do pessoal lá de casa, amarrei a mochila à moto com a aranha e saí... A ajudar à pouco vontade momentãnea em sair, a cara de drama da minha mãe, habitual sempre que eu saiu da moto, quase num choramingar a perguntar-me se eu não quero levar antes o carro dela...

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Arranquei com a promessa de dar notícias quando chegasse a Miranda do Douro e a vontade de rasgar a estrada imediatamente ficou ao rubro. Primeira paragem na área de serviço de Mindelo para ajustar a pressão dos pneus. Encontro dois motards espanhois, montados em costums. Convidei-os a seguirem viagem comigo. Com um sorriso respondem-me que eu tenho cara de quem anda muito depressa! Afinal, iam para Sul, enquanto eu ia para o interior. Com o mapa dei-lhes algumas explicações e sugestões para tornar a viagem deles mais colorida. Despedimo-nos com os votos de boa viagem e boas férias.

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Novamente em andamento na A28 sigo até ao desvio para o aeroporto. Sentia a estranha sensação de perder a mochila; constantemente precisava de lhe tocar com a mão para saber se ali estava e suprir a ausencia do peso nas costas. A sensação de liberdade era boa... as costas soltas e leves... mas causava-me algum desconforto.

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Continuo em auto-estrada, mas o sabor já era diferente... ali, na A24, não passava todos os dias. Mal acabo de entrar, leio num placar electrónico “Verão de 2008, 86 mortes...”, mas o que é que eu tenho a ver com isso?! Porque é que tenho de ser massacrado com as desgraças dos outros?! A sensação de revolta invade-me... esta pre-disposição para a desgraça e tragédia irrita-me profundamente. Compenso com o prazer de subir o velocimentro uns bons kms/h mais...

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Por ali segui, passando a Maia, Paços de Ferreira, até sair para o que resta da A4. A ligação destas duas auto-estradas é... nem sei definir... Já no célebre IP4, a estrada piora, as limitações de velocidade levam-me a prestar mais atenção às bermas da estrada e todo o tipo de recantos, em vez de à estrada propriamente dita. Mesmo assim, o prazer de condução aumentou.

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A temperatura desceu e tornou-se mais agradável para quem vai de moto. A Scarlet comporta-se de forma irrepreensível em ritmo de passeio, permitindo viajar com uma suavidade única, dando lugar ao conforto para poder observar mais a paisagem do que a estrada. A falta do peso da mochila nas costas continua a causar-me estranheza... é uma sensação de aventura, desafio e mudança caracterizada pelo arrepio que nos ocorre quando, por momentos, parece que nos esquecemos de algo em casa. Novos paineis com a mesma mensagem... que raio, o que é que eu tenho a ver com isso?! Essa estupidez de que andar depressa é perigoso é para gente tacanha e desprovida de cérebro! Deixem-me andar á vontade! Passar os 250 kms/h, romper as laterais dos pneus, raspar os avisadores no chão! Não ponho ninguém em perigo, ao contrário de todos aqueles que a 120 kms/h vão distraídos com o telefone, GPS, computador de bordo, leitor de DVD, ar condicionado, rádio... ou a fumar um cigarro!

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Avanço no IP4 e a paisagem torna-se cada vez mais interessante; a estrada, deliciosa; o cheiro de Verão e férias varia e delicia-me a cada quilómetro. Paro na área de serviço de Mirandela, a única do IP4... Vou tomar um café e comer alguma coisa... já lá vai uma hora e pouco de viagem. A mochila lá está intacta, amarrada pela aranha ao banco. Deixo a mochila na moto... com algum receio, não maior que a preguiça de a tirar de lá. Ninguém deve fazer nada. Dou um telefonema à Paula que me espera em Miranda do Douro, que me volta a explicar o caminho por Espanha, onde a estrada é melhor. No regresso à moto, a Scarlet tinha colhido mais um admirador... é sempre isto! Pergunta-me que tal é uma Triumph, quanto é que dá, quanto é que gasta, quantos cavalos tem, se a moto se porta bem... Acaba por confessar que tem um XJ600, mas que anda pouco com ela, porque foi operado, e os problemas que teve com a ferrugem nos escapes e a garantia da Yamaha. Esteve na concentração de Bragança (de carro) e pergunta-me se vou para lá. Explico que não sou grande adepto de concentrações e que vou até Miranda do Douro. Olho para o relógio e finjo-me apressado... lá consigo desgrudar de uma conversa que ia demorar o dia todo (espero que o pobre homem não leia esta história!).

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Regresso à estrada que se mostra cada vez mais interessante. Apenas numa determinada secção apanho um vento gelado, que o meu casaco de Verão me transmite na perfeição. Por momentos recordo os dias de Inverno. Continuo a estranhar o excesso de liberdade nas minhas costas. A mochila apesar de amarrada pela aranha, desliza no banco, quer nas acelerações, quer nas travagens.

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O IP4 é uma estrada fascinante. Este fascinio apenas foi interrompido numa subida em que um camião a 20 kms/h, obrigou-me a engrenar uma primeira e espreitar até poder ultrapassá-lo.

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Já bem mais à frente, reparo que a ligação a Espanha ainda não é assegurada pelo viaduto, que daria continuidade à “via rápida” em que circulo. Para mim são boas notícias! Tive a oportunidade de reviver a estrada para Quintanilha, que fiz agora pela primeira vez de moto! É de facto um delírio! Uma estrada estreita de duas faixas, rodeada de verde denso e sombrio, com óptimo asfalto. Curvas sensacionais! Relembro ainda as vezes que ali passei em miúdo com o meu Pai ao volante. Relembro ainda as histórias do meu avô, Chefe de Alfândega antes de 1974, e que longos turnos fez naquela tão mítica fronteira. Infelizmente a distância era curta, pelo que rapidamente e com alguma nostalgia passo pelo posto fronteiriço e entro numa estrada distinta, mas muito boa, em Espanha.

Esta estrada, muito bem conservada, permite rodar depressa, fazer curvas rápidas e sempre com grandes margens de segurança e visibilidade. Mais à frente, uma bomba de gasolina. Aproveito para reabastecer, pois para trás já ficaram mais de 300 kms. O homem da bomba de gasolina é Português, ao que se segue conversa sobre gasolina mais barata e sobre a moto. Lindíssima diz ele! Mas prefere a Daytona (tem uma!).

Poucos quilómetros à frente encontro à direita o desvio para Portugal. Entro numa estrada estreita que atravessa o Parque Natural de Miranda do Douro; atravessa também algumas aldeias. Mas o mais caricato é que o referido Parque varia literalmente da água para o vinho! Ou seja, tem uma zona de vegetação verde e densa, que rapidamente se transforma numa “planície alentejana”, seca e árida.

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Chegado a Miranda do Douro, rapidamente encontrei o hotel. Estacionei a moto em frente à porta, onde ficou até ao outro dia de manhã. Fiz o check in e fui ao quarto trocar de roupa e refrescar-me. Logo a seguir chegava a Paula para me levar a almoçar. Distraímo-nos com as horas ao almoço e acabamos por perder a possibilidade de fazer um passeio de barco... Felizmente, Miranda do Douro é uma cidade muito bonita, onde tem sido feito um esforço grande de reconstrução e remodelação. É muito agradável passear a pé e conhecer os mais diversos recantos na zona histórica. E como o que é bom passa depressa, rapidamente estávamos a jantar num restaurante divinal e a seguir a conhecer a “noite” de Miranda do Douro. Apesar disso, deitei-me cedo. No dia a seguir, além do regresso, esperava-me um momento inédito!

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Acordei pouco depois das nove... preguicei um bom bocado mais, tomei um banho calmamente e fui ao pequeno-almoço! A minha refeição favorita, além da fome já apertar! Check-out e prender a mochila à moto. Devo ter arrancado pouco depois das 11h00. A paisagem fantástica do parque natural de Miranda do Douro repete-se... O asfalto de péssima qualidade poe-me à prova quando tenho de travar repentinamente por causa de um cão que atravessa a estrada deserta... Não vi o cão... não sei se por ali andava e eu estava distraído com a paisagem, ou se estava escondido e saltou do nada para o meio da estrada... Felizmente não caí, nem atropelei o cão... Entro em Espanha novamente e volto a parar na mesma bomba de gasolina. De facto, a gasolina é muito mais barata e por pouca que caiba no depósito, vale sempre a pena. Aproveito para tomar um café (o do hotel era para esquecer...) e para comprar uma água, que o calor aperta!

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Ao meio dia já estava no Aeródromo de Bragança. Parei a moto debaixo de um sol abrasador. Logo a seguir percebi que um dos monitores de vôo já lá estava. Informou-me que as térmicas estavam a começar a levantar e que o melhor seria irmos comer alguma coisa, para depois voar. Assim fiz e às 14h00 já estava dentro do hangar, onde co-habitavam vários planadores...

Olhar para aqueles aparelhos é quase um privilégio... poder observar como uma estrutura tão frágil nos consegue suster no ar por tanto tempo. Mais, conseguimos ganhar altitude sem motor!

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Alguns destes planadores são lindíssimos... obras de engenharia a todos os níveis, mas também de design... impressionantes!

Finalmente percebi que ia voar numa sucata de metal (e não de fibra como os outros que lá estavam... lindos!) com 40 anos e de cor cinzenta. Mesmo assim era extremamente leve. Empurrei-o com o monitor do hangar até ao início da pista... demoramos para aí um quarto de hora! Eu já soava em bica... ainda por cima com calças e sapatilhas de andar de moto...

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Depois de muitas informações e recomendações sobre temas sempre úteis, como por exemplo, como soltar o vidro do cockpit para nos ejectarmos; como saltar de páraquedas, etc., fomos os últimos a descolar da pista. É incrivel como um planador descola tão facilmente... A avioneta mal tinha arrancado e já nós estávamos a um metro do solo. Fomos rebucados até aos 600m de altitude, altura em que o monitor sentiu uma térmica e largou o cabo. A coisa não correu muito bem... apanhámos um poço de ar e num abrir e fechar de olhos já estávamos nos 300m, com o monitor a pedir-me desculpa pelo passeio ter sido tão curto (isto entre muitos palavrões). A esta altitude o piloto é obrigado a fazer-se à pista, por questões de segurança... até porque em Bragança não há outro local onde se possa aterrar... Este homem já com os seus 60 anos mostrou o que valia, e conseguiu-se agarrar à ponta de uma térmica muito estreita já a 250m de altitude. Entre voltas muito apertadas lá fomos lentamente subindo. Afinal, o vôo parecia que não estava perdido...

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A certa altura transmite-me que já estávamos novamente nos 600m... “não estamos a perder nem a ganhar” dizia ele! Ao que eu respondi: “...óptimo! Então alargue as voltas um bocadito, porque já tenho o estômago todo embrulhado!”. Ele riu-se, mandou-me beber água e olhar para o horizonte. Continuamos a subir. Agora que os movimentos dos aparelhos eram mais suaves, pude apreciar com calma a serenidade da paisagem... De facto, o mundo parece ter sido feito para o vermos de cima... É fantástico! Os estupores dos pássaros são uns sortudos!

Assim foi até aos 1.200m; a esta altitude comecei a ficar zonzo... mas zonzo a sério. O piloto explicou-me que não era enjôo, mas sim o ouvido interno que não estava habituado a compensar em altitude; “...vai-se lá com o treino e com o hábito. Ao início todos estranhamos...” dizia ele. Como a coisa estava mesmo complicada, ele optou por me passar os comandos da aéronave. Segundo ele, ia ficar bom logo! E assim foi! De facto, acabaram-se as tonturas... E começou o êxtase total!

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É realmente emocionante guiar aquilo! A manche faz 4 movimentos: inclina o avião para a esquerda e direita, e afunda ou levanta o nariz. Depois temos 2 pedais, que são uma espécie (de magazine!) de leme, ou seja, fazem o planador virar para a direita ou esquerda. Para curvar, o planador necessita de um equilíbrio de leme e de inclinação. Um tanto como nas motos, onde para curvar usamos um misto de inclinação e volante. Se inclinarmos demasiado o avião ou usarmos pouco leme, vamos perder velocidade e altitude: o avião cai para dentro da curva. Se usarmos muito leme e pouco inclinação vai deslizar para fora da curva (como se nos despistássemos), perdendo posteriormente velocidade e altitude.

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Há muitos manómetros no painel do cockpit onde se lê muita informação: altitude, graus, alinhamento do aparelho, bússola, etc.. Na verdade, a informação mais útil vem de um pequeno fio colado no vidro do cockpit, por uma fita-cola. Se o fio permanecer a direito, é porque estamos a voar correctamente; ou seja, curvamos bem, equilibramos bem a inclinação do avião com o leme. Este fio deve estar a direito independentemente de irmos em frente ou a curvar. Se incorrermos em excesso de inclinação, o fio vai pender para o lado de fora da curva (estamos a cair). Se usarmos demasiado leme e pouca inclinação, o fio vai pender para o lado de dentro (estamos a derrapar no ar). É incrível como as coisas simples nos podem ajudar tanto... O movimento do fio é provocado pelo vento, que nos permite fazer esta leitura tão útil e tão simples. Até um massarico como eu, que nunca tinha guiado uma aeronave, consegue apanhar o jeito da coisa ao final de 10 minutos! O problema é que em 10 minutos, caímos dos 1.200m para os 400m...
Por sugestão do piloto, optamos por nos dirigirmos à pista e aterrar. Já estávamos no ar à 50 minutos... ora, um baptismo de vôo naquelas condições não deve exceder os 30 minutos. É violento; o avião deu inúmeros coices entre térmicas e poços de ar... e os massaricos ressentem-se... dizia ele...

É incrível como um avião daqueles aterra facilmente... não usamos mais de 50m de pista! Devemos ter pousado nos primeiros 3m e o avião abrandou rapidamente. Só quando saí do planador é que percebi o porquê de não ser aconselhável vôos grandes para massaricos. De facto, voei mais de uma hora! Mas agora parecia que o chão não estava quieto... Só pensava agora em como levar a Scarlet até ao Porto! Ainda por cima, tinha de estar em casa antes das 8, porque um amigo fazia anos e tinha combinado levar a família lá para casa para comemorar!

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Despedi-me do monitor, agradeci o passeio e toda a atenção que teve comigo. Ficou a promessa de um regresso... a adrenalina é inesquecível! Arranquei devarinho e parei num café para tomar uma coca-cola com limão: cafeína precisa-se... estava mole de toda aquela trepidação (parecia que o céu era uma estrada de parelelo e o planador um kart); por outro lado, servia também para cortar alguma náusea ainda presente.

Regressei ao IP4 e guiei tranquilamente. Estava uma tarde óptima para passear de moto. Não parei na área de serviço desta vez. Guiei seguido até bem mais à frente e parei numa zona de descanso antes de chegar a Vila Real.

Vejo um motard parado e paro ao lado dele. Eis que encontro um personagem VIP! Paulo Marta, da PSP de Vila do Conde e conhecido pelo envolvimento na iniciativa “A Estrada na Escola”. Falámos um bocadito... Ele vinha da concentração de Bragança. Estava orgulhoso da sua Fazer recém comprada... É muito bonita, diga-se de passagem. Lá nos fizemos à estrada! Ele ia para Vila do Conde e eu para Mindelo, portanto, o caminho era o mesmo... é claro que eu estava um tanto stressado com as horas... queria chegar cedo para tomar um banho antes do meu amigo chegar com a família. Claro também que o Paulo Marta é respeitador dos limites de velocidade... viemos a 130 kms/h e lá o forcei a chegar aos 150 numa altura ou outra... Parámos depois das portagens para nos despedirmos e seguimos para a A28. Na saída para Mindelo acenei-lhe um cumprimento de motard e fui para casa. Cheguei às 19h30, tomei o meu banho e depois fui brindado com um jantar fantástico: não me refiro só à comida, mas especialmente ao ambiente e às gargalhadas.

Sábado lá regressei ao trabalho... mas a vida de empresário é assim! Saudades do tempo em que trabalhava por conta de outrem... em que havia férias... feriados... fins-de-semana... vejam lá que até havia ordenado!

Sérgio